Como dissemos no último post (você pode acessá-lo AQUI), o filósofo Martin Heidegger (1889-1976) realizou uma extensa crítica ao modo como a Filosofia, desde Platão, fixou sua compreensão sobre o SER (aquilo que as coisas são) no conceito (ideal e só alcançado pela razão), e não na manifestação (aquilo que apreendemos sensorialmente).
Em seu diálogo Fédon, Platão recomenda explicitamente que os amantes da sabedoria “deem as costas” àquilo que captam pela visão, ouvido e demais sentidos, concentrando-se exclusivamente naquilo que lhe é trazido pela razão. Para o pensador grego, o caminho para a Verdade dos seres estava naquilo que chamava “meditação filosófica”, uma espécie de reflexão introspectiva.
Ao longo da história da Filosofia, essa epistemologia (meditação filosófica) deu lugar a outras. Na Idade Média, por exemplo, sob forte influência da Igreja, foi substituída pela revelação divina. No início do Iluminismo, Descartes retoma a razão como instrumento para obtenção do conhecimento legítimo e apresenta a matemática como caminho para este saber (o que dá fundamento às ciências modernas).
Porém, permanece intocada a premissa de que a Verdade das coisas não se encontra em seu aparecer, mas alhures.
A Psicologia surge neste contexto. Em 1879, Wilhelm Wundt cria, na Universidade de Leipzig (Alemanha) seu Instituto Experimental de Psicologia, marco do nascimento da ciência psicológica.
Neste início, em acordo com o que pregava o racionalismo moderno, a Psicologia se concentrava em estudar fenômenos quantificáveis por meio de análises algébricas e estatísticas. Era a época da Psicofísica. Sujeitos eram submetidos a estímulos físicos e quantificáveis e sua reação era verificada por meio de relatos verbais.
A Psicologia se mantém como ciência exata desde este início até poucas décadas depois, quando atravessa o Atlântico e chega aos EUA, onde se modificará para dar origem ao que conhecemos como “ciência do comportamento” (behaviorism).
Ocorre que um grupo de estudiosos passa a questionar a viabilidade de se manter a Psicologia dentro dos exigentes padrões de uma “ciência natural”. Argumentam, entre outras coisas, que a relação entre estímulos e respostas nem sempre é inequívoca, que a situação estimuladora é percebida por diferentes sujeitos de maneira diversa, conforme sua experiência anterior em relação aos estímulos apresentados.
Nomes como o do filósofo Franz Brentano, juntamente com os psicólogos da Gestalt (Koffka, Köhler e Wertheimer), passaram a fazer oposição ao mecanicismo estrito apresentado pela Psicologia até o momento.
Entra em crise a Psicologia científica e mecanicista.
Então, se iniciam estudos que distanciam a Psicologia de sua origem cartesiana, e passam a buscar outras referências para seu desenvolvimento.
Na mesma época, ocorrerá aquilo que Michel Foucault chamou de “reviravolta da Psicologia”. Para ele, a mudança definitiva que alteraria os rumos de grande parte do saber psicológico se processa dentro da obra de Sigmund Freud.
Com o pai da psicanálise, o estudo de estímulos e respostas e a origem biológica dos fenômenos psíquicos vão dando lugar à análise sobre a história de vida e à importância do contexto social específico a cada sujeito.
Assim, um novo campo de estudos e atuação começa a tomar contornos. Surge uma Psicologia preocupada com os significados, sentidos e valores da vida humana, aspectos de quantificação impossível.
Ora, se para uma Psicologia de viés cartesiano, bastavam as ferramentas de mensuração típicas das ciências naturais, para uma nova Psicologia, ocupada do não mensurável, novos instrumentos e ferramentas de análise têm que ser encontrados.
É nessa perspectiva que a Psicologia passa a se aproximar de pensamentos filosóficos do século XX (como a fenomenologia e o existencialismo), na busca de sua hermenêutica (seu modo próprio de interpretação dos fenômenos psíquicos).
Semana que vem esse papo continua. Até lá, envie sua opinião ou sugestão fazendo CONTATO.