
Inibição, timidez, dificuldade de interagir e se integrar em grupos. Insegurança para o convívio e desejo constante de se afastar. Grande suscetibilidade a críticas.
É fácil perceber que o sujeito com Personalidade Evitante passa por muitos desafios em sua vida diária.
E, como resultado de suas próprias características, tem extrema dificuldade de procurar ajuda (ou até mesmo de confiar na ajuda que recebe).
ORIGEM PRECOCE
A “teoria do apego”, desenvolvida pelo psicólogo John Bowlby (1907 – 1990) descreve, de maneira bastante interessante, o processo através do qual os seres humanos, desde sua mais tenra infância, constroem relações afetivas de identificação com figuras de apego. Essas relações primordiais são o fundamento das relações futuras, no que diz respeito à segurança de si como alguém de valor ou não, e do mundo como local de acolhimento ou hostilidade.
Mary Ainsworth, colega de Bowlby, desenvolveu uma experiência em laboratório, denominada “Situação Estranha”, para lançar luz a essa questão.
O experimento foi estruturado […] nas seguintes etapas: a) incialmente, o bebê permanece com a mãe; b) em seguida, a pessoa não familiar ingressa no ambiente; c) posteriormente, a mãe se retira e o bebê permanece com o estranho; d) a mãe retorna ao local e a pessoa não familiar sai do ambiente; e) dando sequência ao experimento, a mãe se retira e o bebê permanece sozinho; f) posteriormente, o estranho retorna; g) por fim, a mãe volta ao local e a pessoa não familiar se retira do ambiente.
(Gomes, 2012, p. 26*)
Bebês com apego seguro, geralmente protestam e choram quando a mãe sai de cena, acolhendo-a com felicidade quando ela retorna.
Bebês com apego evitante quase nunca choram quando a mãe deixa o local e evitam-na em seu regresso. Tendem a se mostrar indiferentes e não a procuram se precisar de seu auxílio.

COMO É O SUJEITO EVITANTE?
Já na infância, é possível identificar padrões de comportamento que indicam o início do desenvolvimento da Personalidade Evitante.
Crianças muito tímidas, fechadas, que procuram o isolamento e têm medo de estranhos e de situações novas, podem tornar-se adultos Evitantes.
Com a chegada da adolescência e, posteriormente, da vida adulta, os impactos da Personalidade Evitante tendem a ser maiores. Conforme o sujeito cresce, a importância das relações sociais aumenta, e a incapacidade deste convívio costuma trazer sofrimento.
Podemos, neste ponto, fazer uma análise da Personalidade Evitante (PE) a partir de sua ética (ethos, em grego, tem como um dos significados o termo “morada”, ou seja, lar).
A morada da PE é uma espécie de bunker, uma casa bastante sólida, com paredes espessas e muros altos. Por outro lado, suas portas e janelas (canais de comunicação) são pequeninas e trancadas a chave.
O sujeito de PE é internamente intenso, mas, por medo, compartilha pouco com o ambiente.
O medo que acompanha o sujeito de PE é o de ser inadequado, desadaptado, não ser aceito como é. Na base da PE, costuma estar uma autoestima muito precária, um senso de si um tanto limitado, ou até ridículo, como se, para o próprio sujeito, qualquer pessoa do mundo fosse mais interessante que ele mesmo.
Este modo de ser costuma limitar as possibilidades de vida, principalmente se o sujeito insistir em tentar se “encaixar” nos moldes em que outras pessoas conseguem obter sucesso.
Por exemplo, no contexto profissional, a PE costuma trazer dificuldade para lidar com ambientes altamente competitivos. O medo da avaliação pode fazer o sujeito esconder seus resultados, ou mesmo rejeitar oportunidades de crescimento, aprendizagem e promoção. Novas responsabilidades podem ser entendidas como chance de novas críticas, e lhe parecerem hostis. Situações de trabalho em equipe podem apavorar.
De fato, na PE, as relações são evitadas até que possam ser vistas como seguras, ou seja, ausentes de crítica e desaprovação, o que nem sempre é possível.
CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO DE TRANSTORNO
A 5ª edição do DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) apresenta o Transtorno de Personalidade Evitativa, indicado por quatro (ou mais) dos seguintes critérios diagnósticos:
– Evita atividades profissionais que envolvam contato interpessoal significativo por medo de crítica, desaprovação ou rejeição.
– Não se dispõe a envolver-se com pessoas, a menos que tenha certeza de que será recebido de forma positiva.
– Mostra-se reservado em relacionamentos íntimos devido a medo de passar vergonha ou de ser ridicularizado.
– Preocupa-se com críticas ou rejeição em situações sociais.
– Inibe-se em situações interpessoais novas em razão de sentimentos de inadequação.
– Vê a si mesmo como socialmente incapaz, sem atrativos pessoais ou inferior aos outros.
– Reluta de forma incomum em assumir riscos pessoais ou se envolver em quaisquer novas atividades, pois estas podem ser constrangedoras.
MANEJO CLÍNICO
O sujeito de PE pode relutar em procurar ou aceitar ajuda profissional, uma vez que a desconfiança está presente em quase todas as suas relações.
É importante que o clínico tenha ciência de que seu primeiro esforço deve estar sempre no estabelecimento de um setting aceitador, de acolhimento e segurança, de modo que o sujeito de PE possa sentir-se confortável com a situação.
O processo terapêutico tem como norte permitir que o paciente compreenda as relações humanas a partir de outro prisma, a saber, que elas podem ser oportunidades de prazer e crescimento, e não apenas de rejeição e humilhação. O terapeuta terá oportunidade de fazer o paciente vivenciar essa compreensão na situação clínica, trabalhando os conteúdos que forem trazidos “transferencialmente”.
Além disso, o processo terapêutico deve ser um espaço não-hostil de auto exploração, para que o paciente possa se conhecer melhor e sentir-se mais seguro consigo mesmo.
* GOMES, Alessandra de Albuquerque. A teoria do apego no contexto da produção científica contemporânea. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2012.

CRP 06/56201-2
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