Palavras-chave: felicidade; satisfação
Por Psicólogo Rodrigo Giannangelo | Publicado em 23 de fevereiro de 2022
Felicidade é substantivo abstrato. Isso significa que pertence ao mundo das ideais, não tem concretude. Não “existe”.
Não existe fora de nós. Não se compra em loja, nem se acha no topo de uma montanha, nem se apanha das mãos de um guru.
Também não existe dentro. O que existe dentro é reação ao que está fora – os sentimentos, por exemplo – raiva, medo, alegria. Não existe sentimento felicidade.
Ainda assim, as pessoas querem ser felizes.

Aristóteles abordou o assunto há 2.500 anos. Afirmava, sem dúvida: “Dizer que a felicidade é o bem principal parece uma platitude [banalidade]”. Porém, reconheceu nossa dificuldade de entender o que desejamos quando falamos em “felicidade”, e que tendemos a confundi-la com prazer.
E eu acrescentaria: afinal, por que não? Que prazer diferente seria esse, que chamamos felicidade, e qual seu papel na vida humana?
A felicidade pode ser entendida como emoção momentânea, como quando as pessoas dizem: “Sua mensagem me deixou feliz”. Mas a maioria de nós reconhece que o conceito de felicidade é mais complexo. Essa percepção sobre a incompletude da felicidade levou desde Aristóteles, até filósofos medievais, a argumentar que a felicidade é melhor entendida como um julgamento sobre a vida de alguém como um todo. A felicidade também pode ser entendida como um estado cognitivo de satisfação com a vida, como quando alguém diz: “Estou feliz com meu emprego”.

Felicidade, Satisfação e Longevidade
Alguns anos atrás, um artigo do Million Women Study, no Reino Unido, causou rebuliço na comunidade dos profissionais de saúde, fornecendo evidências de que sentir-se feliz quase não tinha associação com a longevidade. Revisões mais completa da literatura sobre o bem-estar psicológico e o risco de mortalidade encontraram resultados bastante semelhantes.

A sensação de ter um propósito na vida, por exemplo, parecia influenciar muito mais a longevidade que a tal felicidade.
No entanto, a história é outra quando avaliamos o fator “satisfação com a vida”. A influência de estar satisfeito com a vida sobre a longevidade é substancial.
Estudo com dados longitudinais de cerca de 13.000 idosos descobriu que aqueles com altos níveis de satisfação com a vida eram 26% menos propensos a morrer do que aqueles com níveis baixos.
Também encontrou evidências de efeitos da satisfação com a vida em vários outros itens, incluindo melhor saúde, melhor sono, mais atividade física e menos depressão.
Mas, qual a diferença??
Eis a principal diferença: a satisfação é algo que tem concretude.
Reflita comigo: a satisfação começa com o desejo. O desejo é sentido pelo sujeito como falta, lacuna. Essa falta gera uma tensão, sentida no corpo e representada mentalmente. A tensão motiva o sujeito a procurar por aquilo que pode preencher sua lacuna – o objeto do seu desejo.
Preenchida a lacuna, a tensão deixa de existir. Esse novo estado é sentido no corpo e representado mentalmente – o sujeito se sente satisfeito.
Assim, enquanto “felicidade” é um conceito sem correspondência física e mental precisa, a “satisfação” é uma vivência subjetiva completa.

Estar satisfeito não resolve a questão
Alguém pode, em princípio, estar satisfeito com sua vida, e levá-la sendo assaltante. Tudo bem?
Por outro lado, alguém que faz o que é certo apenas porque se sente moralmente coagido pode avaliar mal a própria satisfação com a vida. E aí?
De fato, a questão parece ainda longe de estar totalmente compreendida.

Felicidade Perfeita
A felicidade ou a satisfação com a vida são tudo o que deveríamos estar procurando?
Entendo que, conforme a literatura hoje disponível, a resposta é “não”.
Há inúmeros outros aspectos importantes que devemos examinar também.
Para alguns, a perfeita felicidade depende de uma conexão espiritual – São Tomás de Aquino (revisor escolástico da obra aristotélica) defendeu filosófica e teologicamente essa tese. Para outros, a felicidade é apenas uma utopia – mais uma ideia ilusória que a humanidade criou para não se contentar com a satisfação possível, como um cão que corre atrás do próprio rabo.
E você, o que acha?
Referências
Kim, E.S., Delaney, S.W., Tay, L., Chen, Y., Diener, E., and VanderWeele, T.J. (2021). Life satisfaction and subsequent physical, behavioral, and psychosocial health in older adults. Milbank Quarterly, 99:209-239.
Lomas, T., Case, B., Cratty, F., and VanderWeele, T.J. (2021). A global history of happiness. International Journal of Wellbeing, 11(4).
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