Palavras-chave: personalidade esquizoide; tipos de personalidade; esquizo
Por Psicólogo Rodrigo Giannangelo | Publicado em 11 de julho de 2022
A personalidade esquizoide pode se apresentar como um paradoxo: uma pessoa distante e fria escreve poesias sensíveis e emocionantes; um eremita sofre com a solidão, mas não renuncia a ela; alguém talentoso e culto é incapaz de realizar qualquer coisa.
Por outro lado, pode se manifestar como enigma: um cientista excêntrico, um filósofo obscuro ou um artista inacessível. Ou como estigma: o pária, o desajustado, o estranho.

O que significa personalidade esquizoide?
De fato, o paradoxo da condição surge no próprio termo: esquizo, do antigo grego, significa desagregação, desunião.
Aliás, os prefixos -des / -dis (que têm o significado de ‘ação contrária’) costumam aparecer com frequência na descrição do termo esquizoide: desconexo, desassociado, dissociado, disjunto. Ou seja, pressupõe-se que nossa personalidade seja um núcleo integrado, formado por diversos elementos. A personalidade esquizoide, porém, se estrutura como uma orquestra desarmônica, cujos instrumentos executam partituras diferentes.
Acompanhamento psicológico da personalidade esquizoide
O acompanhamento psicológico do sujeito esquizoide revela outra contradição.
Embora não costume ter grande interesse por relacionamentos, o sujeito esquizoide é capaz de se entregar à relação clínica de forma engajada.
O psicanalista e psiquiatra escocês Ronald Fairbairn (1889-1964) pesquisou a importância das relações subjetivas e das reflexões como blocos de construção da personalidade. Ocorre que o tipo de personalidade mais propenso a tal reflexão é o esquizoide; sua intensa introspecção torna mais disponíveis seus medos, memórias, ideias e sonhos.
A metáfora do caráter esquizoide dada pelo psiquiatra alemão Ernst Kretschmer ajuda a entender essa questão relacional e sua aplicação à terapia. Kretschmer compara o esquizoide a uma antiga vila romana, com sua aparência simples e persianas bem fechadas, atrás das quais ocorrem festas exuberantes.
O esquizoide, como a antiga vila romana, tem aparência não expressiva, com persianas bem fechadas, por trás das quais as fantasias florescem. As persianas simbolizam o próprio caráter segregador do mecanismo esquizo, que divide aparência e mundo interno. Enganado pela fachada simples, um transeunte desavisado ignora a atividade que acontece dentro da vila. Pode até pensar que não há vida lá dentro, que a vila está vazia.
Um terapeuta com o olhar desse transeunte observa o esquizoide e percebe apenas a indiferença, não só perdendo as experiências internas, mas ignorando a própria existência das persianas.
Por outro lado, um terapeuta sensível olha para a mesma fachada, mas vê muito mais. Percebendo as persianas fechadas, tenta ter algum vislumbre do que está acontecendo atrás delas.
Cobertas pelas persianas esquizo, estão fantasias, ansiedades e esperanças, simbolicamente ligadas a experiências significativas – traumáticas ou não. A terapia diminui a dissonância entre pensamento e sentimento, entre vida concreta e fantasia. As persianas tornam-se menos densas, abrindo caminho para a integração.
O risco do excesso de reflexão
A tendência do esquizoide de refletir sobre suas fantasias têm potencial para facilitar a terapia e melhorar a vida dos pacientes. Mas há outro lado desta moeda. O excesso de reflexão pode distorcer esse processo, criando a sensação de vazio.
Essa ruminação pode ser comparada ao impacto da luz na percepção de objetos. Sem luz, o objeto permanece invisível. A luz ajuda a ver o objeto de forma clara e nítida. Mas uma luz muito forte e brilhante distorce a percepção, desfocando ou manchando o objeto. Sob o excesso de reflexão, o mundo interior do esquizoide ganha contornos de irrealidade. Pensamentos, sentimentos, fantasias e sonhos desaparecem. Experiências subjetivas vivas são transformadas em sombras.
Esse sentimento perturbador de vazio pode se assemelhar a uma vivência de irrealidade – a despersonalização esquizoide [1].
Devido à segregação existencial em sua personalidade, a vida emocional do esquizoide é frequentemente dilacerada por sentimentos ambivalentes e/ou contraditórios. A psicoterapia do esquizoide é, ao mesmo tempo, um desejo e um desafio; às vezes, o medo e a desconfiança podem dominar a ponto de inviabilizar o vínculo terapêutico. O esquizoide sempre conta com o conforto de sua “bolha” – a interioridade apática e distante – para se proteger.
Concluindo
A própria manifestação do sujeito esquizoide exprime a ambivalência de sua condição. Em um momento, o terapeuta lida com uma pessoa fria, absorta e pouco receptiva. Parece impossível alcançá-la e realizar terapia. No entanto, no momento seguinte, essa pessoa se torna delicada, perspicaz e aberta a um diálogo significativo.
A abertura emocional do terapeuta, sua assertividade amorosa e sua compreensão ajudam o paciente a encontrar um caminho para um maior equilíbrio entre o exterior e o interior de suas persianas esquizoides.
Referências
Bezzubova E. (2020): Virtual self and digital depersonalization: between existential dasein and digital design. Mind and Matter 18 (1), 91-110.
[1] O psiquiatra suíço Eugen Bleuler (1857-1939) é autor dos termos esquizofrenia e esquizoide – utilizou o termo “autismo” pela primeira vez em 1911 para descrever um sintoma de esquizofrenia definido por ele como “desligamento da realidade combinado com a predominância relativa ou absoluta da vida interior”.
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