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Aprender com os erros funciona melhor do que com os acertos

Palavras-chave: Aprender com os erros; aprendizagem

Por Psicólogo Rodrigo Giannangelo | Publicado em 14 de outubro de 2023


Aprender é algo que fazemos desde o nascimento e ao longo de toda vida.

Aprendemos por:

– Experiência direta, ou seja, por nossa própria vivência, ou;

– Socialmente, observando, lendo, ouvindo especialistas etc.

A psicologia e a neurociência já entenderam que a aprendizagem social não é tão profunda e duradoura, e por isso sempre há coisas importantes que precisamos aprender por experiência direta.

Por que resistimos a aprender coisas novas?

Quando aprendemos, as novas informações não costumam “inaugurar” espaços em nossa memória. Em geral, informações novas substituem informações antigas sobre o mesmo tema – quando, por algum motivo, as novas se mostraram melhores, mais atualizadas, mais úteis etc.

Mas essa substituição pode ser bastante desconfortável. Por isso, tendemos a nos apegar a perspectivas antigas.

Para evitar o desconforto da mudança, alguns mecanismos psicológicos podem atuar, de modo inconsciente, isoladamente ou em conjunto. Por exemplo:

  • Viés de confirmação: tendência a considerar apenas as evidências que confirmam o que já sabemos ou achamos que sabemos, descartando o que nos contradiz;
  • Efeito “tiro pela culatra”: quando alguém desafia uma crença enraizada em nós, e que não queremos mudar, essa crença fica ainda mais forte;
  • Pensamento de grupo: expressão cunhada pelo psicólogo Irving Janis para designar a adesão de indivíduos à visão dominante do grupo a que pertencem, de forma irrefletida.

Aprender com os erros ou com os acertos?

Se nosso “eu” do presente pudesse viajar no tempo para ensinar ao nosso antigo “eu” algumas lições de vida, possivelmente ficaria decepcionado. Muito do que diríamos a nosso “eu” do passado não seria aprendido, porque precisaríamos experimentar / viver essas lições diretamente.

É mais cômodo rejeitar o que os outros tentam nos ensinar – “ele está errado”, ou “isso vale para ele, mas não para mim” são ideias que tentam nos manter em nossa zona de conforto. De fato, aceitamos melhor o que aprendemos com a experiência direta.

Agora podemos dar um passo adiante. Não só precisamos vivenciar certas situações nós mesmos, mas essas situações devem ser, de algum modo, dolorosas. Um dos entrevistados de um grande estudo (1) sobre o tema resumiu dessa maneira: “Tudo que aprendi, aprendi depois de ‘bater a cabeça na parede’”.

Outro estudo, publicado em 2010 (2), já mostrara que o erro nos ensina melhor que o sucesso, e que as lições aprendidas com o sucesso são mais facilmente esquecidas.

Aprender com os erros na experiência direta

O aprendizado por experiência direta também desafia nossas visões de mundo. Portanto, também pode nos desconfortar.

Então, por que é mais fácil? Como e o que aprendemos?

Do ponto de vista cognitivo, o processo é complexo: envolve um triplo insight, uma interação intuição-reflexão, e uma montanha-russa de sentimentos(!). Termina com a aprendizagem de conjuntos de regras simples, semelhantes a provérbios.

Em resumo, o aprendizado começa com um erro que desafia a maneira como pensávamos que as coisas funcionavam.

Em princípio, não entendemos o que deu errado. E isso nos incomoda. O que não funcionou? Remoemos o que aconteceu; trazemos aquilo repetidamente à nossa cabeça, conversamos com pessoas dispostas a ouvir… tudo para entender qual suposição se mostrou falha e precisa ser desaprendida.

Então, somos tocados por uma discussão, uma leitura ou uma situação semelhante que desencadeia o pensamento (analógico). O insight é triplo: o que precisamos desaprender, o que precisamos aprender e o que precisamos fazer a respeito. Esses segundo e terceiro insights são organizados em regras simples, provérbios que fazemos para nós mesmos para capturar melhor a lição.

Um exemplo

Imagine esse caso hipotético:

Uma pessoa está treinando para disputar uma maratona. Seu joelho começa a doer, mas ela ignora e continua a preparação. No dia da prova, ela não consegue concluir o percurso por causa de uma dor intensa no joelho. Logo depois, ela precisa se submeter a uma cirurgia reparadora. Ao longo desse processo, um erro se torna gatilho para uma mudança de perspectiva.

O triplo insight nesse caso funcionaria da seguinte forma:

1° insight: antes, a pessoa achava que poderia usar seu corpo para correr sem limites. Essa suposição se mostrou equivocada, levando à lesão, portanto precisava ser desaprendida.

2° insight: compreensão da suposição verdadeira, resumida em uma regra simples: “Devo ouvir meu corpo e tratá-lo com respeito”.

3° insight: entender como aplicar esse novo princípio em seu treinamento físico cotidiano, articulado em regra pragmática e simples, como, por exemplo: “Ao início de qualquer dor, devo prestar atenção. Se ela persistir, eu paro.”

Como podemos acelerar nosso aprender com os erros?

Com base na estrutura do triplo insight, podemos entender a importância de levantarmos três aspectos:

– Qual suposição provou não ser verdadeira;

– Qual é a verdadeira;

– O que precisamos fazer a respeito.

Esse esquema pode ser traduzido pela seguinte frase padrão:

“Antes de fracassar, eu achava que (…),

mas aí eu percebi que (…);

agora, eu devo fazer (…).”

E acredite, funciona. Você pode tentar aplicar a um erro recente e tentar entender melhor.

Se articulamos essa nova lição em um provérbio pessoal curto e interessante é mais provável que nos lembremos dela. Mais tarde, depois de testar e reforçar o aprendizado, também podemos compartilhá-lo com pessoas que podem se beneficiar da nossa experiência.

Referências

1. Atanasiu, R., Ruotsalainen, R., & Khapova, S. (2023). A simple rule is born: how CEOs distill heuristics. Journal of Management Studies, 60(5), 1064–1104.

2. Madsen, P. M., & Desai, V. (2010). Failing to learn? The effects of failure and success on organizational learning in the global orbital launch vehicle industry. The Academy of Management Journal, 53(3), 451–476.

aprender com os erros

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